Derradeiro Impacto

quarta-feira, 12 de maio de 2010

Há momentos com um player que toca a música que o personagem está escutando... se você ver o símbolo  em algum momento do texto e não conseguir clicar no sinal do player, clique no navegador correspondente aqui:


Mozilla


--------------------------------------------------------

          Eu tinha acabado de chegar na capital. Meus três amigos estavam na rodoviária me esperando chegar, todos ansiosos, afinal já fazia um bom tempo que eu não os via. Meus dois amigos que moravam juntos no centro, e a namorada de um deles, que também fazia parte do nosso círculo de amizades. Ao chegar, dei um abraço apertado em cada um deles, lembrando dos velhos tempos em que vivíamos próximos e fazíamos brincadeiras no meio da noite. Quando terminaram os comprimentos e todo aquele ritual de mata-saudade entramos no carro e fomos em direção ao apartamento em que eles moravam juntos. Perdemos aproximadamente quarenta minutos no trajeto da rodoviária até o apartamento de dois quartos que eles tinham alugado no centro da cidade. Fomos boa parte do caminho escutando rádio, porém quando começaria a parte das notícias da cidade decidimos desligar e voltar a falar as besteiras que quando estávamos juntos surgiam com tanta naturalidade quanto as risadas que vinham logo depois. Mas meu pensamento não estava focado ali, estava em outro lugar, precisamente do outro lado da cidade onde ela morava. Pensei por alguns instantes em tudo que tínhamos passado juntos. Nossos momentos de alegria e tristeza, os abraços apertados que teimavam em jogar minha tristeza sempre para longe... Afastei esses pensamentos da minha cabeça, pois uma pontinha de angústia começava a tomar conta de mim. Fazia já algum tempo que eu não a via. Mas tinha prometido a mim mesmo que dessa vez não ia passar. Eu iria ligar pra ela e combinar de nos encontrarmos. Ela com certeza iria adorar, afinal eu sabia que ainda gostava de mim... - E eu dela pensava, enquanto cutucava a namorada do meu amigo, no banco da frente, quando ela imediatamente me dá um tapa na mão e mostra a língua, antes do carro inteiro encher-se com risos e palmas.
          Chegando no apartamento, pegamos as malas, aliás, eu peguei as malas, pois absolutamente ninguém iria carregá-las pra mim, inclusive colocaram as coisas que eles estavam carregando sobre as malas pra eu carregar também, enquanto riam da minha cara sofrendo com os dois malões e uma mochila a tira colo, subimos até o sétimo andar e entramos no pequeno apartamento deles. Na sala de estar, o primeiro cômodo que entrei, tinham dois sofás brancos, com revestimento macio, um de dois e outro de três lugares, em forma de 'L', e o rack da TV de 32 polegadas que ficava bem em frente ao sofá de três lugares. Coloquei minhas malas no carpete em frente ao sofá e corri para o banheiro, afinal esse trajeto de carro tinha me enchido a bexiga. Saí de lá e voltei para a sala, onde todos estavam sentados olhando um filme que estava dando em algum dos vários canais da tv a cabo. Quando cheguei, estava começando uma edição especial do jornal, que provavelmente anunciava morte de alguém famoso, mas que como de costume não iríamos dar bola, e apertando ooff no controle remoto, fomos todos para a janela atrás do sofá simples, coberta por uma cortina transparente branca, que dava na sacada, com uma vista incrível do centro da cidade. Ficamos ali sentados jogando conversa fora enquanto eu peguei meu celular e comecei a criar coragem para ligar pra ela.
          Vários minutos se passaram, quando decidimos ir para um dos morros que cercam a cidade. Geralmente de cima deles era possível vislumbrar toda a cidade, e uma enorme parte do mar. Por ser uma capital costeira, podia-se ver mais o mar do que a própria estrutura da cidade, o que fazia com que os morros fossem o local preferido dos casais apaixonados, fato que fez meu coração apertar ainda mais.
          Quando decidimos que seria melhor acabar, pois ela estava se mudando para a capital, ambos sabíamos que mesmo sendo uma decisão acertada, deixaria em ambos, um pedaço do coração do outro, afinal nos gostávamos muito, mas a distância nesse caso impediria qualquer chance de ficarmos juntos. Ao menos era o que eu pensava para tentar não ficar tão mal, e impedir que a dor no estômago que sentia quando pensava nisso, não machucasse tanto. Mais tarde, ao olhar pra trás talvez fosse difícil mas não impossível ficarmos junto, mas era melhor deixar esse assunto de lado agora.


          Quando subimos no morro, estacionamos o carro no final da estrada, que dava para um paredão de pedras assustador, que ficava logo ao lado de um dos maiores resorts da região, e que agora estava praticamente aos nossos pés, quando sentamos na beira do morro, deitamos e ficamos olhando para o céu do entardecer, que já não mais ardia os olhos quando tentávamos imaginar desenhos de animais nas nuvens. Após tentar insistentemente ver a raposa mordendo um elefante que meu amigo insistia que estava 'na cara' bem acima de mim, levantei e fui em direção ao carro, com o celular em punho, decidido a ligar pra casa dela.
          Chamou uma vez, chamou outra. Clic - Alô? - Era a mãe dela. Tentei disfarçar a voz e de uma maneira muito estranha, perguntei se ela estava em casa. - Ela deu uma saída, quem gostaria? - clic. Não tive coragem de me identificar e desliguei o telefone rapidamente. Quando virei pra frente todos estavam me olhando. A namorada de meu amigo se levantou, veio até mim e me abraçou forte - Sei que ainda sente falta, mas vai passar - eu sabia que não, ainda mais que eu tinha decidido vê-la.
Entrei no carro, dei ré até perto de onde estávamos , levantei a tampa do porta-malas, e liguei o rádio em uma freqüência local, que tocava uma musica  , enquanto víamos possivelmente o pôr-do-sol mais bonito de todo o estado.
          Enquanto a música tocava, vários momentos voltaram à minha mente, e foi impossível não deixar uma lágrima escorrer e o frio na espinha se tornou inevitável. Eu realmente gostava dela... Meus olhos foram lentamente se fechando, em meio àquele emaranhado de lembranças passando lentamente em frente aos meus olhos. As nuvens quase não preenchiam mais o céu, o que fez com que desse para ver algumas poucas estrelas enquanto minha consciência começava a esvair-se. Olhei para os lados e vi que meus amigos já estavam de olhos fechados, provavelmente dormindo como eu - eu gosto dessa música - como último pensamento antes de me desligar completamente do resto do mundo...
          - ACORDEM! - Pulei rapidamente com o grito de meu amigo, quase me desequilibrando, e tentando recobrar meus sentidos antes de cair montanha abaixo. Olhei pra ela e perguntei por que diabos tinha me acordado daquela maneira. Porém ele não me falou, apenas esticou o braço e apontou para o céu. Acompanhando com o olhar, olho para cima e vejo o céu todo preto, porém sem estrelas, o que significava que estava tomado de nuvens. - Nada de mais - pensei, alguns segundos antes de notar um brilho laranja no céu um pouco além do limite da cidade com a praia. Um brilho que se aproximava.
          Olhei para baixo e vi milhares de pessoas nas ruas e encima dos prédios, todas tentando entender o que estava acontecendo. Decidimos então trocar a rádio e colocar em um noticiário local, pois talvez alguma informação estivesse disponível. No momento em que a frequência chegou ao ponto em que deveríamos escutar as vozes dos radialistas dando as notícias, apenas o silêncio, porém sem nenhum chiado. Alguns estalos e então tomei o segundo susto da noite quando a voz do locutor chegou ao meus ouvidos falando alto e rapidamente algumas palavras desconexas, e impossíveis de entender, já que a transmissão estava sofrendo muitos cortes. Paramos para prestar atenção compreendemos apenas algumas palavras perdidas: catástrofe, incrível, assustados, salvem-se e anunciado durante o dia... voltamos a olhar para o céu, e aquela mancha laranja parecia descer rapidamente, e crescia quanto mais se aproximava. Tive apenas tempo de dar um passo em direção à borda do morro, quando percebi as nuvens subitamente se abrirem aonde aquilo descia, e agora já era possível perceber o que era.
          Um meteoro do tamanho de um dos grandes prédios da cidade descia flamejante pelo céu indo em direção ao mar, não muito longe da costa. Começamos a ouvir os gritos, mesmo de onde estávamos. Meus amigos estavam paralisados olhando aquele espetáculo da natureza, completamente inconsequentes para qualquer coisa que pudesse estar acontecendo de verdade. Se aproximavam lentamente do precipício quando corri até eles e num gesto os puxei para trás, fazendo-os caírem sentados, no momento em que o meteoro estava no local mais baixo possível antes de tocar o mar.
          Os eventos que se sucederam me fizeram arrepiar até o último pêlo das costas.
          No instante em que o meteoro toca o mar, um tremor intenso chegou até nossos pés, e por sorte eu os tinha feito sentar, se não cairiam com certeza para cima do resort. Em meio aos nossos próprios gritos, corremos até o carro, e por sorte a chave deu partida. Trocamos as rádios na esperança de saber mais algumas coisa, mas parecendo uma piada divina, a única rádio que pegava era uma estação underground que tocava algumas músicas que muito pareciam descrever a  trilha sonora do acontecido. Quando andamos alguns metros, nos olhamos e percebemos que faltava alguém. Descemos do carro e corremos para trazer a garota, que tinha ficado olhando para aquela cena. Quando chegamos até ela, viramos a cabeça em direção ao mar, bem em tempo de perceber uma onda gigantesca vindo em direção à cidade. Já era possível ver o engarrafamento em meio aos destroços dos prédios que começavam a ruir. Muitas pessoas de carro tentando sair da cidade, enquanto a onda vinha a uma altura incrível. Como num filme qualquer falando sobre algum desastre de 2012, porém muito mais aterrorizante, era possível perceber a destruição em uma cidade que não estava preparada para tremor algum. A onda estranhamente crescia à medida em que se aproximava, o que começava a me assustar, pois não estávamos tão alto assim para escaparmos daquela água. Olhamos novamente para o céu e mais pontos brilhantes começavam a descer. Voltamos para o carro, e fomos à toda velocidade para longe. Alguns minutos depois, quando já parecia ser seguro sair, paramos o carro e começamos a comentar sobre o que estava acontecendo, porém meu pensamento parecia não ir a lugar nenhum, exceto a uma casa, na subida do morro.
          Pedi permissão para pegar o carro, e todos já sabiam quais eram meus planos, mas ninguém fez objeção. Entrei no carro, e liguei-o, ao mesmo tempo que pegava o celular. Já digitava o número dela, que estava gravado na minha memória e por um bom tempo não sairia. Fui em direção à estrada da cidade novamente, quando comecei a me desesperar. A ligação caiu na caixa de mensagens. Dirigi cada vez mais rápido, desviei de várias árvores que caíram com o tremor. Disco novamente os números, mas meu coração bateu duas vezes mais rápido, quando novamente a ligação não é completada. Liguei para a casa dela. Algum alívio quando o telefone começou a tocar, porém passou rapidamente quando percebi que ninguém iria atender. Comecei a descer a encosta do morro. Consegui ver através das árvores que a cidade estava quase toda submersa, porém a água estava baixando. Escutei alguns gritos, e parece que conseguia ver algumas pessoas nadando em direção às grandes construções para se salvarem. Tentei uma terceira vez ligar, e o mesmo resultado. Estava descendo muito rapidamente, quando encontrei um mutirão de carros subindo, dando sinal de luz e me chamando de louco por estar voltando para a cidade. Fiz várias manobras arriscadas, pois nenhum motorista queria ficar atrás do carro da frente, e todos com muita vontade de sair cortando a frente de todos, sem perceber nenhum perigo nisso.
          Após várias manobras de fórmula 1, entro na rua alagada em que ela mora. Já não sabia se tremia de ansiedade ou de medo. A rua fazia parte de um complexo de casas construídas na encosta do morro, onde a água parecia não ter chegado com tanta voracidade, mas mesmo assim alagada. Parei o carro de qualquer jeito na frente da casa branca de dois pisos e grades da mesma cor, onde ela morava. Desci do carro e corri para a frente do portão. Toquei a campainha, e quase deixei escapar um riso quando percebi que não iria ter nenhum sucesso, afinal a cidade estava sem luz. Bati palmas, quando vi a mãe dela vir em minha direção, de camisola amarela e chinelos de dedo. Ela abriu o portão e me deu um abraço apertado, fazendo com que eu me sentisse um pouco melhor. Após esse momento de reencontro, pego as mãos dela e peço onde está sua filha. Ela começou a chorar me dizendo que ela saiu para ir até a biblioteca, mas não tinham conseguido entrar em contato com ela ainda. Pensei em pegar o carro e sair atrás, mas não fazia a mínima idéia de onde ficava a biblioteca. Ela me falou que seu marido já estava à caminho da biblioteca e que só me restava esperar.
Entramos na casa dela, também levemente alagada e sentamos no sofá, e ficamos em silêncio aguardando qualquer sinal. Me levantei e peguei novamente o celular, e em vão tentei ligar pra ela. Fui até a janela, era possível ter uma ampla visão da cidade, porém não consegui prestar atenção em nada, afinal só uma coisa me importava. Fui novamente até a frente da casa, na esperança de vê-los vindo. Minha apreensão aumentava a cada segundo que passava. Já nem nos momentos felizes que tive com ela conseguia pensar, afinal estava à beira de uma tragédia.
          Tento dar uma volta pela quadra para ver o que estava acontecendo, e caio no chão com outro tremor. Olhei para a estrada e vi que ela começou a desmoronar. Que ótimo, era tudo que precisávamos, a única maneira de sair da cidade estava agora rolando morro abaixo...
          Após vários minutos, que pra mim pareciam uma eternidade, vi o carro dele dobrando a esquina. Os vidros pretos me impediam de ver se ela estava com ele. Esperei até o carro parar, e vi as duas portas se abrindo.
          Agora, meu coração parece saltar pela boca no momento em que vejo ela saindo do carro. Uma marca vermelha de aproximadamente 2 cm ia da parte esquerda da testa, até quase o queixo, no lado direito. Ela olha pra mim, e sorri, saindo correndo em minha direção. Recebo aquele abraço como uma faísca que reacende a chama, aquecendo meu coração gelado pelo frio e pelo medo. Ela olha pra mim, e com os olhos marejados, começa a contar sobre a viga da biblioteca desmoronando e caíndo em sua direção, acertando o rosto e atirando longe o celular. Não consigo prestar muita atenção nas palavras que saem daquela boca que baila como se estivesse ao som de uma melodia primaveril. Apenas aconchego ela novamente em meus braços firmemente, e levo ela até a beirada da rua, onde é possível ver a cidade. Faço um carinho no rosto, passando os dedos pelos cabelos longos dela, e quando chego atrás da cabeça com a mão, puxo-lhe para perto de mim, encostando meus lábios nos dela, e dando um longo e apaixonado beijo, enquanto toda a preocupação por qualquer coisa que pudesse estar acontecendo parecia sumir naquele momento. Quando abrimos novamente os olhos, nos abraçamos e viramos para a cidade. Ela faz um carinho de leve em minha mão, vira para mim e, com uma voz doce, fita meus olhos e pede: - Fica comigo pra sempre? -. Esse pedido parece um sonho. Abraço ela bem forte... - Prometo que sim - digo, enquanto vemos os novos meteoros que caem e lentamente começam a tocar o mar, fazendo uma onda duas vezes maior começar a se formar...

5 Comentários:

Gilberto disse...

muito bom o conto, me prendeu do inicio ao fim, esse tu se puxou ein?ahahahah

Paloma Rizzi disse...

Parabens... teu conto tah me fazendo chorara ateh agora.. =~ ?Lindo demais! ^^

Vanda Ferreira disse...

Nossaaaaaaaa que lindo!!! Adorei a história. Lembrei do filme "Impacto Profundo" hahahaha Muito bom mesmo! Você escreve muito bem e descreve cada detalhe, nos dando a sensação de fazer parte da história!

Muito bom! Continue assim! Sucesso no blog!


Vanda Ferreira: http://vanda-ferreira.blogspot.com/

√αиy ﺖ disse...

Adorei o conto!
Esta cada vez melhor!
Agora só falta o livro! :D hehe
Abraços

Andres Carreiro Fumega disse...

Olá, Álisson!
Muito bom texto! Uma história de amor com uma pitada de catástrofe. E a ideia das musicas foi muito boa! Parabéns e vê se continua o outro conto, pois estou querendo saber o que o cara viu, hehehehe!
Abração!