Down

          Em uma tarde qualquer, vários supervisores estavam exercendo as suas profissões nas diversas escolas de educação infantil das redondezas. Nada muito diferente do rotineiro, se não fosse pelo que estávamos para testemunhar em uma determinada escola, onde a pequena Clarinha estudava.
          Clarinha era uma criança que corria, brincava e conversava quase como todas as outras, com exceção de um fato que a tornava muito especial. Clarinha era portadora da Síndrome de Down. O trabalho que a supervisora chamada na escola naquela tarde fazia, era justamente o de avaliação de métodos de ensino que eram utilizados quando se trata de ensinar crianças com necessidades especiais.
          A tarde ia passando, enquanto o professor inventava as mais diferentes brincadeiras para educar os pequenos, que algum tempo irão se tornar nossos Médicos, nossos Advogados, nossos Dentistas…
          Porém quanto mais o tempo avançava, mais as tentativas de incluir Clarinha nas brincadeiras iam se tornando frustrantes. Nas brincadeiras de roda ela era a última a sentar quando a música acabava, as respostas dela às perguntas mais simples se tornavam um emaranhado de sílabas muitas vezes de difícil compreensão, os desenhos que ela fazia geralmente não passavam de riscos disformes, longe de se tornarem alguma obra interessante, mesmo para uma criança de poucos anos de idade. E seus coleginhas riam… ah como eles riam dela.
          Em uma tentativa desesperada, o professor titular naquele dia resolveu contar uma história. A história do sol.
          Colocou todos sentados em uma roda, e começou a falar sobre o quanto o sol era uma coisa boa, o quão bem o sol faz para os animais, ajudando a mantê-los aquecidos, ajudando a secar os pelos que a noite gelada molhava, ou o quanto era útil para as plantas, ajudando as folhinhas respirarem, e até mesmo da importância que o sol tinha diretamente para as pessoas desse mundo.
          Após pausadas explicações, vários folhas de ofício foram pegas e distribuídas por entre as crianças e muitos lápis de cor foram jogados no meio da rodinha para cada criança pegar um e desenhar o seu sol.
          Alguns minutos se passaram, quando praticamente todas as crianças tinha desenhado seus sóis amarelos, dos mais diversos tamanhos, com olhos, boca, inclusive alguns com bracinhos e perninhas. Todas menos uma…
          Clarinha ainda estava olhando para aquela folha de papel quando seus coleguinhas já demonstravam sinais de impaciência, por ela nem ter começado ainda.
          Foi então que ela pegou um lápis com a cor preta, e começou a socar a ponta dele com força naquela folha de papel. Quanto mais força ela fazia, maior era o silêncio que começava a pairar pela sala. Então, já sem idéias, o professor exausto anda até a supervisora, coloca-lhe a mão no ombro e diz:
          - Tá vendo como é difícil trabalhar com ela? Não consigo fazer ela participar, e quando ela participa ela faz coisas completamente sem sentido. Não sei o que fazer…
          Nesse momento, a supervisora anda até Clarinha, agacha-se ao lado dela, envolve-a nos braços, aponta para a folha e diz:
          - Sol, Clarinha?
          Então um dos mais belos sorrisos existentes na face da terra se abre no rosto daquela criança, que aponta pra janela e diz:
          - uuuuVÁÁÁÁÁÁÁÁÁ…
          Então um arrepio percorre toda a extensão do corpo da supervisora, ao desviar seu olhar para a janela e perceber que estava chovendo

Até quando o ensino irá ser levado por profissionais despreparados para lidar com as situações que exigem que uma rotina diferenciada seja aplicada quando alunos diferenciados pisam nas salas de aula?
Até quando as pessoas irão se esconder atrás do rótulo de 'crianças especiais' que precisam de aprendizagem diferenciada, quando na verdade é o ensino que precisa ser modificado?
Até quando iremos pensar que essas crianças não tem nenhuma percepção do mundo à sua volta, quando na verdade somos nós que não temos essa capacidade?
Por que os professores se atém a explicar coisas que não fazem o menor sentido para o cotidiano, quando o que os alunos realmente necessitam é perceber que o que está sendo ensinado é de fato o que está sendo vivenciado?
POR QUE o professor decidiu ensinar sobre como o sol é importante se estava CHOVENDO?
Este conto na verdade é uma percepção minha, de um fato verídico que foi contado à mim. Nenhum nome escrito condiz com a realidade, por motivos óbvios…



Links legais em:


8 avaliações sobre a 21º Bienal Do Livro de São Paulo

Segue post que fiz para o blog Listas Listerárias com minhas 8 considerações sobre a Bienal do Livro em SP:


21° Bienal do Livro de SP

Bom pessoal, como sabem estive esse fim de semana em SP (A cidade das filas) para participar do lançamento da Antologia Sinistro 2: Contos de Terror, com organização do Frodo Oliveira, da editora Multifoco, como contei em posts anteriores. Vou fazer uma pequena sessão de fotos, com minhas impressões sobre tudo o que presenciei lá...
Espero que não se chateiem de sairmos da linha de contos, mas não é sempre hehe.
E um recadinho para os ansiosos: Provavelmente amanhã estaremos preparando tudo para o próximo capítudo da Imersão em Contos, e sábado ele estará no ar...

Além das considerações que vocês irão ler ao clicar em Leia Mais, visitem o Listas Literárias do meu amigo Douglas Eralldo para ver os oito pontos da Bienal, escrito por mim: http://listasliterarias.blogspot.com/2010/08/8-avaliacoes-sobre-21-bienal-do-livro.html

O Menor Conto do Mundo

Pois é... Ontem um amigo meu me mostrou um link sobre o menor conto do mundo, e andei pesquisando sobre isso, achei algo pertinente para um blog de contos.

O menor conto do mundo, há muito tempo pertencia à Augusto Monterroso, de obra intitulada "O Dinossauro", que tinha apenas trinta e sete letras. Segue o microconto:

Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá.
Então, parecia que ninguém conseguiria condensar uma história tão cheia de significado em menor quantidade de letras, até que em 2004 a argentina Ana Maria Shua publicou o texto, em trinta e três letras:
Fujamos! Os caçadores de letras estão aq...
Pois é.. e hoje eles são mundialmente famosos... Lanço um desafio aqui.. Alguém consegue criar um microconto com menos de 33 letras? Eu vou tentar. Virou um objetivo de vida hehehe...

Comentem com as idéias aí...

E aguardem, em breve mais novidades sobre a Imersão em Contos... o que teria visto nosso amigo Maurício?
Esperem e descubram....

Imersão em Contos [4]

Leia a série do início: Prolegômeno
Capítulo anterior: O Início
A Descoberta
 
              Aquela noite invernal começava a trazer suas marcas. Os pés gelados de David marcavam a queda brusca de temperatura, comum naquela época do ano. Aproveitou que rolavam apenas comerciais, e foi até seu quarto trocar aquela roupa do trabalho e botar algo mais confortável. Pôs uma meia de lâ, um par de alpargatas, uma calça de abrigo, e foi se enrolar em um cobertor, no sofá da sala. Atento com o início do segundo bloco do programa, recosta a cabeça em uma almofada na guarda do sofá, e lentamente vai desligando-se do barulho dos carros que vem lá de fora...

Voltamos à apresentar nosso especial sobre o caso de Maurício. Após a tinta da caneta acabar, ele sai em busca de outra caneta, e pelo visto demora vários minutos para conseguir isso. Quando consegue, segue escrevendo sobre o que aconteceu naquele dia. Confira:


         “Até que enfim consegui achar uma maldita caneta nessa casa escura. Se ao menos tivesse algo que iluminasse mais que uma lanterna. Minha vontade era bater minha cabeça na parede até que não sobrasse mais nada dentro dela. Mas não posso. Preciso escrever. Preciso que todas as pessoas saibam o que está acontecendo aqui. Onde parei mesmo? Acho que estava no momento em que tinha começado a procurar as chaves para tentar abrir a porta que deveria estar já aberta. Isso mesmo.

         No momento em que decidi ir atrás das chaves, logo saí da sala onde eu estava, passando para a sala em frente, pois sabia que lá tinha uma pequena estante com algumas gavetas onde poderiam estar as chaves. Atravessei o portal que levava para a sala posterior com a lanterna em punho, pois não conheço ninguém que goste mais de mesinhas de centro do que Luna. Entrei na sala, iluminando todos os lados em busca de alguma pista do que poderia estar acontecendo, porém tudo estava no mais absoluto silêncio, e imerso na escuridão características dos vidros cobertos. Logo à direita já me aproximei da pequena estante, procurando em suas gavetas e portinholas por vestígios de alguma chave, ou até mesmo algo que me fizesse entender o que estava havendo. Porém novamente sem nenhum sucesso. Apenas algumas revistas velhas e pilhas, o que ao menos me era útil, pois a lanterna não parecia estar com toda sua potência.

         Enquanto tirei calmamente todos os objetos de dentro das gavetas, criando uma certa bagunça, escutei um barulho alto vindo dos quartos. Foi um barulho tão intenso de algo caíndo, batendo, ou seja lá como posso descrever aquele som, que me apenas tive a instintiva reação de largar tudo da maneira que estava, derrubando alguns objetos inclusive, e correr para o corredor dos quartos, chegando em quatro passadas largas à porta do quarto de Luna, que era o último do corredor. Tentei abri-lo porém estava da mesma maneira que a porta da frente, completamente trancado. Imaginando que o som pudesse ter vindo de outro quarto, virei-me para o lado e dei um passo em direção à porta do segundo quarto. Dessa vez antes de fazer qualquer besteira puxei o trinco da porta para baixo, e empurrei lentamente a porta, abrindo completamente a minha visão para o quarto, porém o que eu percebi lá dentro fez com que eu sentisse como se estivesse com uma maçã grande e podre dentro da minha boca. Além do cheiro pútrido que o quarto exalava, no momento em que a porta encostou na parede, desviei o facho da lanterna para a janela e tive a impressão de ver algo se mexendo por trás da cortina e que não consegui identificar. A cortina ondulou como se algo tivesse passando de um lado a outro, até movimentar suavemente os pedaços de pano que estavam jogados em cima da cama. Quando os movimentos silenciaram completamente o seu bailar sinistro, escutei um forte estampido bem ao pé do ouvido, fazendo com que eu me jogasse para trás, batendo as costas na parede do corredor, derramando alguns pingos de suor gelado pelo susto que acabara de tomar.

         Após alguns segundos me recuperando do susto, dei um passo à frente e passei rapidamente os olhos por todo o quarto buscando o causador daqueles barulhos, mas dessa vez muito mais apreensivo. A cama estava sem qualquer forro, tendo apenas alguns pedaços de pano encima. O guarda roupas em frente à cama tinha todas as portas abertas, porém nada continha a não ser algumas prateleiras e vários cabides velhos atirados a esmo, assim como alguns velhos insetos que não ficaram muito satisfeitos comigo importunando seu sono que já deveria durar alguns dias. Girei meu corpo um pouco à direita em direção ao balcão que ficava ao lado da cama, quando tomei meu segundo susto do dia. Quando a luz da lanterna tocou a parte de cima do balcão, vi um vulto preto saltar em minha direção. Com o susto, me joguei para trás e estatelei no chão do quarto, quando aquele negócio com não mais de 60 cm saía correndo em direção da cozinha, miando de medo, esparramando pelo chão várias caixas de sapato. Mais uma vez me levantei do chão sujo e entrei quarto adentro, já com o medo vagando longe, e fui averiguar o que tinham naquelas caixas que o gato estúpido tinha derrubado.

         À primeira vista, consegui perceber algo quadrado que refletia a luz da lanterna. Cheguei mais perto e  percebi que havia uma câmera dentro das caixas. Por um lado tive sorte por ela estar ligando, porém não me adiantou de muita coisa, já que não havia nenhuma foto dentro dela. Guardei a câmera no bolso e voltei minha atenção novamente para o chão. Com luz direto nas caixas, percebi um brilho dentre os objetos caídos. Estendi minha mão direto àquele brilho, e puxei até mim um pequeno chaveiro em forma de estrela. À medida em que iluminava as diferentes partes dessa estrela, vários feixes multicoloridos eram projetos na parede, formando os mais diversos objetos. Fiquei alguns segundos admirando a beleza das formas, quando me dei conta de que havia uma chave na ponta desse chaveiro.

         Alegre com minha descoberta, voltei à porta de entrada, passando pelo corredor, agora todo impregnado pelo fedor que saía do quarto, e fui direto testar se conseguiria abrir a porta. Lá chegando, fui tão afoito que quase cometi um acidente ao forçar a fechadura com uma chave que não entrava no buraco. Esbravejei por alguns instantes, mas logo pensei o que poderia significar aquela chave.

         Voltei lentamente à porta do quarto dela, imaginando que eu precisaria nesse momento de um golpe de sorte, mas depois de tantos revezes, quem sabe né?!

         Cheguei em frente à fechadura do quarto de Luna, fechei os olhos, torcendo para que desse certo. Prendi o ar, segurei a chave em minhas mãos, e finalmente o primeiro alívio, a fechadura aceitou. Faltava a segunda parte. Vagarosamente girei a chave, e pra minha surpresa a fechadura retraiu, e a porta se abriu. Em dois passos já estava dentro do quarto.

         Eu preciso descrever o que vi. Mas por mais que pense e rabisque nessa maldita folha não consigo encontrar as palavras certas para descrever o que eu vi e senti. Por isso, farei com que seus próprios olhos possam enxergar o horror pelo qual passei ao abrir aquela porta....”

         Nesse momento a imagem congela. Os olhos de David se esbugalham em pura descrença enquanto imagens começam a se formar na tela... Imagens tão insanas que talvez seja necessário mais do que apenas palavras para mostrá-las...

Próximo capítulo:  O Quarto

 

Veja também:

Novidades [2]

 Boa tarde amigos. É com muita satisfação que faço esse post nessa tarde gelada de agosto.

Alguns meses atrás fiquei sabendo através do meu amigo Lino França Jr., da nova antologia da Multifoco chamada Bandeira Negra. Por coincidência, eu tinha escrito um conto de piratas há pouco tempo chamado Revolto e ele me sugeriu enviar.

Hoje entrei na comunidade do Bandeira Negra no Orkut, e qual não foi a minha surpresa quando o tópico com os escolhidos estava lá postado.

E com prazer que anuncio à vocês que agora faço parte da tripulação comandada pelo Lino, e do nosso contramestre Frodo Oliveira.

Obrigado por mais essa oportunidade pessoal.
Confiram lá: http://bandnegra.blogspot.com/


A Segunda novidade do dia é que eu e a Paloma vamos à bienal \o/.
Estamos com as passagens compradas, e dia 21 estaremos no estande da Multifoco para o lançamento do livro Sinistro 2: Contos de Terror, e se bobear até autografo alguns livros ehehehe. Então SP que nos aguarde, estaremos lá...

E não fiquem tristes, pois a Imersão em Contos continua essa semana, com mais um capítulo.. Aguardem também...
Abraços à todos.

Imersão em Contos [3]

Leia a série do início: Prolegômeno 

Capítulo anterior: O Despertar

O Início

                      Naquela tarde, as frases mostradas no noticiário não saíram da cabeça de David, porém o trabalho não colaborou tanto, fazendo com que ele tivesse que ficar além do horário em um de seus clientes.

         Chegou em casa correndo, porém soube que estava atrasado para o programa quando ligou sua tv e a explicação já estava na metade. Por sorte ainda conseguiu chegar no primeiro bloco da programação. Serviu um copo de refrigerante, acomodou-se na poltrona, relaxou um pouco, e então toda sua atenção se voltou ao que a apresentadora falava:

 

...durante as investigações que se sucederam na cena, notou-se que Maurício tentou de várias formas se comunicar com o exterior da casa. Talvez por acreditar que alguém pudesse lhe ouvir, ou quem sabe ele realmente tenha percebido que alguém estava por perto. Essas tentativas foram registradas das mais diversas formas, e após vários meses de investigações acerca do caso, esses indícios foram arquivados e nunca vieram à publico. Porém, devido a revolta popular com a suspensão das buscas, a polícia retornou ao local. Não obtendo um sucesso maior, e preocupados com a represália da população, decidiram aceitar tornar público o material que fora colhido dentro da casa. Para um melhor entendimento, esse material foi organizado para exibição por sua ordem cronológica de fatos, e não exatamente pela ordem que os indícios foram feitos. Confiram agora com exclusividade, todas as peças desse complicado quebra-cabeça, e tirem suas próprias conclusões.

 

         Uma música de suspense começa a tocar. A tela fica toda preta, e alguns instantes depois uma imagem turva aparece. Aparecem efeitos de olhos piscando, e então uma voz retumbante começa a ler o que seriam os primeiros acontecimentos, enquanto a animação na tela refaz cada palavra dita pelo narrador:

 

         “Tudo começou no primeiro dia. Eu estava muito apreensivo pensando no que poderia ter dado errado para que Luna me ligasse no meio da noite, após tanto tempo. Acredito que minha preocupação afetou algo em meu sistema nervoso e eu mal conseguia pensar no que estava acontecendo, apenas sentia que precisava ajudá-la. Esse foi meu primeiro grande erro, pois graças à isso consegui fazer o mais difícil, que foi arrombar uma porta que nem trancada estava. Acredito ter visto Luna antes de tropeçar e bater a cabeça com toda a força numa mesinha qualquer no meio da sala.

         Quando acordei, minha cabeça doeu tanto, mas tanto, que parecia que eu tinha sido atropelado por um caminhão carregado. Meus olhos dificilmente se acostumariam com aquela luminosidade, pois apesar de ser dia, a sala estava muito escura, pois lembro-me de ter visto tábuas de madeiras pregadas nos umbrais, pelo lado de fora da casa, cortando completamente qualquer feixe de luz que tentasse entrar pelas janelas. Abri meu celular para tentar ver que horas eram, mas esqueci que a bateria tinha acabado ainda em casa. Por sorte ela ainda teria o carregador que lhe dei de presente, afinal até o gosto para celulares temos em comum. Levantei ainda um pouco tonto, pus minhas mãos na nuca, em busca de algum sinal de sangue. Por sorte apenas tive a reação de dar um grito quando toquei no galo que tinha se formado quando caí. Vou tentar descrever como estava essa sala quando aqui acordei: O chão é todo forrado de parquet, com uma mesinha onde fica o telefone logo à frente da porta. Na parede à direita encontra-se uma janela, e ao lado, um sofá verde fora colocado ali para poder assistir à tv que, sem antena alguma, ficava encima de um rack com quatro gavetas. Logo que me levantei, tentei acender as luzes, porém nada ocorreu. Então fui até a tv e a liguei, ao menos para clarear um pouco e não ter perigo de me machucar novamente com qualquer coisa no caminho. Olhei para cima e percebi que as lâmpadas haviam sido retiradas, o que explica o motivo pelo qual nao conseguir acender. Como era de se esperar, apenas chuviscos na tela, mas o suficiente para iluminar um pouco a sala e me permitir procurar o carregador que, por sorte, estaria em algum lugar dali.

         Abri as gavetas e comecei a vasculhar, ainda com uma forte dor na cabeça, em busca do carregador do celular. Na primeira gaveta haviam apenas velhas contas de luz que já tinham sido pagas, inclusive com seus recibos. Tirei rapidamente as contas para me certificar de que não estaria ali embaixo, e logo recoloquei. Abri a segunda gaveta e lá não havia absolutamente nada. Soltando uma breve exclamação de alegria  puxo um cabo que logo reconheci como sendo o que eu estava procurando. Tirei a tv da tomada e logo inseri o carregador, colocando na outra ponta meu celular completamente descarregado.

         Fiquei imóvel em torno de uns 5 minutos aguardando o mínimo de carga, quando abro meu celular e aperto o botão que o liga. Satisfeito por ter dado certo, logo reparo no horário. Já era dia, porém a penumbra dentro da casa não dava a menor impressão do sol já ter se erguido no horizonte. Pelo visto passei algumas horas desmaiado, o que me assustou, pois poderia ter acontecido o que eu temia. Minha primeira reação foi gritar pelo nome dela. Não obtendo resposta, o sangue começou a correr mais violentamente nas minhas veias. Não poderia.... não aceitaria que algo tivesse acontecido com ela por meu descuido. Peguei meu celular e comecei a ligar para o número dela, porém, após três tentativas frustradas desisti dessa idéia.

         Quem sabe ela tivesse saído. Isso, ela teria me visto cair e saiu buscar ajuda, ou fugiu amedrontada. Ninguém sabe muito bem o que esperar da mente de Luna. Fui em direção à porta atrás de mim, e dessa vez tentei abri-la primeiro, porém nada aconteceu. A porta permaneceu intacta e imóvel. Segurei o trinco com as duas mãos e fiz uma grande força para tentar girar a maçaneta e puxar a porta, porém não adiantou. - Isso não faz sentido, pensei, - eu sei que foi por ali que eu entrei, é impossível que agora eu não consiga abrir -. Tentei bater com o ombro na porta, porém arrombar para o lado de fora é uma tarefa um pouco mais complicada.

Só me restou procurar uma chave, ou quem sabe até Luna tivesse em algum cômodo da casa, talvez ferida, talvez dormindo, ou até rindo de tudo isso que ela provocou.

         Voltei ao rack, e vasculhei na última gaveta e por coincidência lá estava uma lanterna, que com algum golpe de sorte talvez estivesse funcionando.

         Aperto o botão e voilá, a lanterna se acende. o  roc ar as ch  es... Drog a ca  ta  stá f lh n d.”

 

         O preto da tela retorna, e agora a imagem está mostrando a repórter.

 

         Nessa parte da carta podemos notar que a caneta falha, o que impede Maurício de continuar seu relato naquele momento. Confiram no próximo bloco, a próxima carta escrita por maurício, e o mistério que começa a se desenhar à partir dos outros cômodos.

 

         David já está no terceiro copo de refrigerante quando o primeiro bloco acaba. E pelo que ele pode perceber, isso estava apenas começando...

Próximo capítulo: A Descoberta

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Imersão em Contos [2]

Leia a série do início: Prolegômeno 

O Despertar

          David acordou aquela manhã cumprindo seu ritual. Espreguiçou-se estralando os ossos das costas e das mãos, deu um bocejo alto e deu um impulso para conseguir sentar na cama. Coçou a cabeça e pegou o controle remoto da televisão, ligando-a no noticiário local. Enquanto a moça do tempo dava suas primeiras previsões para o fim de semana, calçou os chinelos e levantou para pegar a agenda em cima da escrivaninha, que ficava do outro lado do quarto, encostada na parede oposta. Leu os lugares os quais ele teria que visitar, alguns para fazer o orçamento de câmeras novas, e outros para de fato fazer a instalação das já adquiridas câmeras de segurança, por seus clientes.
          Sempre pensava o quanto era bom trabalhar por conta, mesmo sendo em uma área difícil no mercado, por estar cheia de boas e grandes empresas de vigilância, mas com o seu esforço conseguiu se tornar um profissional prestigiado pela região, sendo contactado muitas vezes para fazer esse serviço.
          O noticiário começou a apresentar as notícias do dia anterior. Nada além do normal durante a maioria do tempo. Algumas reportagens sobre cães e seus donos, outras sobre a temporada de chuvas que ultrapassava o volume normal para aquele mês. No intervalo, algumas propagandas de bebidas e gomas de mascar, e uma vinheta que começou exatamente quando ele, já com a escova de dentes fazendo seu serviço matinal, sentou na cama e ficou estático, prestando atenção em cada detalhe. Talvez pela música de mistério, ou quem sabe pelo tom assustador pelo qual eram narrados os fatos, mas seus olhos não desgrudavam da tela.
          “Será apresentado um programa especial sobre alguns fatos que preocupam, assustam e intrigam a polícia local. - dizia a reportagem - Será contada a história do jovem Maurício, de 27 anos, que vem atraíndo a atenção da mídia nos últimos dias. A polícia decidiu reunir e divulgar todo o material coletado sobre esse caso. Confira logo mais ao meio dia uma prévia do que seria a primeira parte de uma carta escrita por ele.”
          Alguma coisa naquela chamada prendeu a sua atenção. Soube que já tinha ouvido sobre esse caso, mas infelizmente não se recordava exatamente do que havia acontecido. Algo dentro dele dizia que ele deveria assistir a esse programa.

          David chegou em casa alguns minutos antes do horário habitual, ligou sua televisão no canal que tinha anunciado a prévia da carta, pegou alguns sanduíches, e sentou-se em frente à tela, aguardando o conteúdo que por algum motivo ele teria que ver.

          “Como prometido, o caso de Maurício irá a público na íntegra, em um programa especial feito com provas encontradas pela polícia, exclusivamente divulgadas para nossa equipe de reportagens,  onde muitas perguntas encontrarão as suas respostas, porém muitas outras ficarão ainda no ar.” - Ele segurava o sanduíche entre o polegar e o indicador, porém a fatia de pão de cima já pendia para o chão, pois sua atenção fora toda direcionada à tv - “Hoje à noite o país irá parar para enfim saber o que todos se questionam. O que aconteceu com Maurício?! Para dar-lhes uma prévia do que vocês irão encontrar, segue um trecho da primeira carta encontrada pelas autoridades locais:”


          E uma imagem de uma carta, com muitas palavras riscadas foram mostradas na tela:


          “...minha cabeça doeu tanto, mas tanto, que parecia que eu tinha sido atropelado por um caminhão carregado. Meus olhos dificilmente se acostumariam com aquela luminosidade, pois apesar de ser dia, a sala estava muito escura. Abri meu celular para tentar ver que horas eram, mas esqueci que a bateria tinha acabado ainda em casa. Por sorte ela ainda teria o carregador que lhe dei de presente, afinal até o gosto para celulares temos em comum. Levantei ainda um pouco tonto, pus minhas mãos na nuca, em busca de algum sinal de sangue. Por sorte apenas tive a reação de dar um grito quando toquei no galo que tinha se formado quando caí...”


          “Segue outros trechos da carta de Maurício” - Dizia a apresentadora.


          “...pelo visto passei algumas horas desmaiado, o que me assustou, pois poderia ter acontecido o que eu temia. Minha primeira reação foi gritar pelo nome dela. Não obtendo resposta, o sangue começou a correr mais violentamente nas minhas veias. Não poderia.... não aceitaria que algo tivesse acontecido com ela por meu descuido...”


          “...isso não faz sentido. Eu sei que foi por ali que eu entrei, é impossível que agora eu não consiga abrir...”

          Com os olhos fixos e a respiração curta, David absorveu cada letra daquela carta, aguardando o que estaria por vir.

Próximo capítulo: O Início

Imersão em Contos

Prolegômeno

          Meus olhos lentamente se abriram nessa noite clara de verão. Escuto algo lentamente começando a vibrar próximo ao meu ouvido. As imagens que meu subconsciente criou durante o tempo em que, entre devaneios construí meus sonhos, como uma névoa dissipam-se em minha frente.
          Em poucos segundos recobro completamente os sentidos, e só então paro para pensar o que seria essa vibração. Começo a tatear no escuro em busca esse barulho incômodo, quando logo percebo o que causa isso.
          Puxando meu celular para bem perto dos olhos que ainda tentam se adaptar à essa claridade, consigo focar no visor, onde infelizmente consigo apenas ler “Número Confidencial”.
- Alô ?! - falo, com uma voz rouca, de sono.
- Está em casa? - diz uma voz, demonstrando grande apreensão no tom.
          Não perco mais do que alguns segundos para perceber de quem era aquela voz. Como poderia deixar de reconhecer a voz de minha melhor amiga Luna.
- Por favor, vem aqui na minha casa... Alguma coisa deu muito errado - Fala ela, já em tom de choro e desespero.
- Nossa, se acalma, estarei aí em alguns minutos, mas o que houve?
- É que...
          Click. A bateria do celular termina. Levanto rapidamente, vou até o banheiro passar uma água na cara, visto uma roupa leve, pego as chaves do carro e saio em direção à casa dela, muito preocupado com o que poderia estar acontecendo. Sabendo seu histórico de tentativas de suicídio, e overdoses de remédios com bebidas, piso fundo no acelerador, pois algo muito ruim parecia estar à caminho.
          Chegando à casa dela percebo que está um pouco diferente da casa que conheci antes. Confesso que fazia algum tempo que não vinha até aqui, mas esse ar sombrio, dado pelas janelas fechadas e luzes apagadas me preocupa muito mais do que talvez precisasse.
          Desço do carro, embarrando um pouco meu tênis, chego à porta e dou uma batida seca e forte, que ouço ecoar pela casa.
          Ninguém aparece...
          Bato várias vezes mais forte, porém recebo o mesmo resultado.
          Depois de alguns minutos o que ainda me chateia é o silêncio que paira por detrás daquelas paredes.       Não consigo parar de andar de um lado para outro apreensivo. O que fazer?! Não acho outra solução que não seja arrombar a porta.
          Dou alguns passos para trás. Respiro fundo. O desespero dela ainda ecoando na minha mente. Olho para a porta, ela parece não aguentar muito peso. Começo a correr, viro o rosto e seguro meu braço forte, para aguentar o tranco, fecho os olhos e sinto o baque da porta, que se abre no instante em que toco nela. Talvez se eu não tivesse esquecido da brilhante idéia de verificar se a porta já não estivesse aberta, teria sido bem mais fácil. Ainda embalado, abro os olhos, e percebo a escuridão inundando a sala, ao mesmo tempo em que sinto meus pés tocando em algo, fazendo-me perder o equilíbrio, e a última coisa que vejo antes de desmaiar com a pancada na cabeça dada graças à quina da mesa de centro que não podia estar em outro lugar senão ali, é alguém parado na porta da cozinha entreaberta, que parecia estranhamente olhar para mim...


Assim foi tecido o primeiro fio na teia da historia, e é assim que ela começa. Alguns dias depois, a casa foi novamente aberta, mas dessa vez pelas autoridades. Os relatos que seguirão ao longo dos dias serão reproduzidos fielmente da maneira em que foram encontrados. Fiquem calmos, analisem todos os detalhes no texto, a fim de entenderem exatamente o que está acontecendo. Inunde sua mente com os relatos, e aguardem para captar o horror que está por vir.

Inicia-se uma nova sério aqui no Depósito de Contos, chamada Imersão em Contos... Convidamos à todos os leitores para acompanhar a história, e comentar os capítulos. Um novo sistema de imersão será apresentado à todos os leitores conforme a trama vai avançando. Essa série contará com a ajuda de meus dois amigos Luis e Paulo [Tio], e logo entenderão o porquê. Espero que gostem...

Próximo capítulo: O Despertar

Capa da antologia Sinistro 2

Boa tarde pessoal, como vão??

Passei aqui rapidinho pra mostrar a capa da Antologia Sinistro 2 (pra quem não lembra, clica aí). O trabalho de capa ficou muito legal... estou ansioso pra comprar as passagens pra Bienal, e conhecer o pessoal da editora :)...

Logo mais contos vem por aí...

abraços \o

Capa: